Já não se usam chapéus. Não mais se ouvem cumprimentos.
Os teus vizinhos são distantes estranhos que se cruzam contigo na rotina destes dias apressados. Caminhas pela rua, entras no autocarro, olhas em volta buscando sentido no que ouves e vês. Como meros autómatos, as pessoas agarram-se à segurança do que conhecem; não se denota gentileza nos seus gestos e actos; não se ouve um “Bom dia” ou “Boa tarde”.
Imagino-me nesta mesma cidade há um século atrás; não me é difícil ver os cavalheiros a baixarem as cartolas, num cumprimento inocente e sincero, quando os passos de uma senhora lhes trouxessem o segredo fugaz do seu perfume.
Há algum tempo, num almoço de amigos, falava-se de chapéus. Ou da falta deles. A personagem mais velha dessas confidências falava precisamente da época em que o chapéu era uma peça marcante da personalidade de cada um. Parecerá talvez egoísta mas apenas me recordo daquele que ele me sugeriu. Uma boina francesa, boemiamente descaída sob os meus cabelos.
Anseio por tempos assim. De chapéus como arte, de chapéus como cortesia. Por vezes encontro-os, entrincheirados em pequenas aldeias dentro da cidade, perdidos na simpatia de um sorriso, de um acenar. Receio, contudo, pela sua perenidade: a cidade envelhece por entre o crescente turbilhão de excitantes bares e lojas e a modernidade de incontáveis espaços culturais. Duvido que o stock da Chapelaria Nacional me conseguisse serenar. Chapéus há muitos, gracejava o outro; o que nos falta é a franqueza para olharmos nos olhos das pessoas com quem nos cruzamos.
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